De acordo com Brandão (1985), a Congada é uma expressão religiosa e cultural de origem afro-brasileira, que ocorre junto as Festas do Rosário que são caracterizadas como festas populares. Organizam-se por meio de ternos de congos, moçambiques, vilões, catupés, penachos, marinheiros e outros, representando grupos históricos específicos.
As Festas do Rosário acontecem de maio a outubro e no estado de Goiás, em várias cidades, onde é possível destacar as que compõem a região da estrada de ferro como: Pires do Rio, Catalão, Goiandira, Ouvidor e Três Ranchos, acontecendo também na capital do estado, Goiânia.
Dentre estas, a cidade de Catalão representa a que possui a maior expressividade, por manter o status de maior Congada do Brasil, contando com 20 ternos de congadeiros com aproximadamente 2.000 dançadores no total, o que viabiliza um verdadeiro espetáculo quando se apresentam reunidos para a entrega da coroa.
A Festa do Rosário de Catalão tem a duração de 10 ou 11 dias, sendo que é organizada de tal modo que o dia 13 de outubro, dia de Nossa Senhora do Rosário, segundo o calendário litúrgico da Igreja Católica seja o domingo da festa que é o segundo domingo de outubro (Brandão, 1985).
Em sua organização há uma divisão entre a parte religiosa representada pelos terços, novenas e missas, que acontecem todas as noites a partir do início da festa e a parte festiva representada pela dança, a música, os fogos, jantares e eventos vinculados à festa além do comércio ambulante que a acompanha desde seus primórdios.
A festa será considerada aberta no momento da Alvorada, que consiste em um evento no qual os ternos de congo se reúnem na madrugada da primeira sexta-feira da festa rumo ao largo da Igreja do Rosário. No trajeto os ternos de congo cantam e dançam em homenagem à Nossa Senhora do Rosário, passando por várias ruas da cidade antes de chegar ao seu destino, para anunciar a festa que se inicia.
Com o desenvolver da festa, na noite do segundo sábado, é erguido o mastro em homenagem à Nossa Senhora do Rosário na praça em frente sua igreja, onde ocorre antes e depois apresentação dos ternos junto aos promotores da festa e participantes populares.
No domingo da Festa, ocorre uma missa pela manhã, ao término desta, os ternos percorrem as casas dos moradores que os convida previamente para realizar a visita e homenagear a Santa em seus lares. À noite ocorre a procissão em homenagem a Nossa Senhora do Rosário, que e composta por padres, Festeiros, Congos e populares. Esta procissão representa o fim da parte religiosa da festa.
No dia seguinte, acontece a Entrega da Coroa, sendo este o evento que encerra a Festa. A Entrega da Coroa é o terceiro grande cortejo da Festa (precedido pelo da manhã de domingo que conduz os festeiros e a Família real para a missa da Irmandade e a procissão da noite). O cortejo sai da casa dos festeiros atuais ou de um local próximo a sua residência e vai para o Congódromo que contém um palanque que é composto por autoridades, Irmandade e convidados, onde um locutor narra a apresentação dos ternos que rendem a última homenagem da festa à Nossa Senhora do Rosário, com apresentações de danças e músicas do congado. Este evento é normalmente prestigiado por um grande número de pessoas que ficam acomodadas em duas grandes arquibancadas (Paula, 2010).
Durante a festa ocorre também o funcionamento de um ranchão, onde acontecem jantares, bingos e dança. Este ranchão é de responsabilidade da Irmandade e serve como área de lazer para os irmãos congadeiros e para os populares. Ocorre ainda o estabelecimento de várias barraquinhas de comércio, onde são vendidos variados produtos durante a festa, o que também atrai grande número de pessoas do lugar e de turistas.
A Congada é formada da reunião dos ternos do Congo, do Reinado e do General. Cada elemento componente da congada apresenta suas características próprias, mas interligadas às demais no processo ritual que compõe a festa. (Paula, 2010)
Para Brandão (1985, p. 33) “o terno de Congos é a menor unidade ritual da Congada” e representa um rigoroso e hierarquizado sistema, cujo comando está subordinado a um capitão. Sob suas ordens e com a função de substituí-lo ante a uma eventualidade estão os suplentes. Nos ternos maiores aparece a figura do 2º, 3º e até 4º capitães que também exercem esta função de suplente.
Os capitães normalmente vestem uma farda diferenciada dos dançadores e trazem, à mão, um bastão, cujos movimentos aliados ao ritmo sonoro emitido por um apito orientam os dançadores quanto à batida e as evoluções a serem realizadas em determinados momentos.
À frente do terno vem um grupo de bandeirinhas carregando os estandartes de Nossa Senhora do Rosário ou dos santos de devoção. É um grupo composto normalmente por meninas já que a tradição pede que as bandeirinhas sejam virgens fazendo uma alusão à virgindade perpétua de Nossa Senhora do Rosário (MACEDO, 2007)
Os dançadores representam o maior número de integrantes de um terno. Conhecidos por soldados apresentam uma formação hierárquica. Na primeira fila ficam os capitães suplentes já mencionados e os guias que são dançadores mais experientes e com melhor preparo para carregar as grandes e pesadas caixas de marcação de ritmo. Depois vêm os que carregam os instrumentos menores como pandeiros, afoxés e banguês. No centro dos ternos entre as duas alas de dançadores vêm os instrumentistas, que tocam violão, viola ou sanfona. No fim da fila normalmente existem um grande grupo de crianças de variadas idades. Algumas de tão pequenas seguem o terno nos braços das mães, muitas delas pagando promessas feitas por genitores ou parentes, garantindo assim a continuidade da festa.
Uma importante figura da Congada é o General que representa uma voz de comando geral da Congada. É um cargo perpétuo escolhido pela Irmandade assim como acontece com o reinado, Cabe ao General conduzir os ternos de congo nos momentos dos cortejos no domingo e da entrega da Coroa na segunda-feira. Seu cargo na ordem da congada é superior ao capitão. Sua indumentária lembra uma farda de general do Exército Brasileiro e também carrega uma espada nos ombros. (RODRIGUES, 2008)
Sendo a congada uma festa de reinado, em Catalão este grupo é constituído pelo Rei, Rainha, os príncipes e as princesas. Nesta realidade a Rainha é escolhida em função do Rei. Pode ser sua esposa ou parenta próxima como mãe ou irmã. Os príncipes e princesas devem ser parentes do rei, e são escolhidos por ele. O Rei também possui poder de comando dos ternos, sendo, de acordo com o Estatuto da Irmandade, superior ao General.
De acordo com o Estatuto da Irmandade do Rosário de Catalão, a religião oficial das Congadas é a Católica. Contudo elementos das religiões de matriz africana aparecem em vários momentos como no uso da bebida chamada Kalunga que se trata de uma cachaça com ervas, feita apenas pelas pessoas que detém os saberes do congado, pois existem regras específicas para preparação da bebida cuja função é fechar o corpo dos dançadores. Além da Kalunga, os capitães também levam seus bastões para serem cruzados nos terreiros, ou seja, benzidos, além das guias, que são colares de contas que carregam, cruzadas no corpo, a fim de fechá-lo contra o mau.
Contudo estas práticas apesar de essenciais para caracterização cultural das congadas, ainda se constituem em algo velado na Congada de Catalão, devido ao preconceito social que existe em relação às religiões de matriz africana no Brasil.
Mesmo assim a Festa do Rosário e as Congadas representam uma importante manifestação da cultura negra na cidade de Catalão, rememorando os horrores da escravidão nas letras das canções, bem como, devido a sua grande dimensão que lhe dá visibilidade nacional, contribuindo para a valorização das pessoas negras no Brasil, que apesar de maioria junto à população nacional, ainda hoje são vítimas de uma severa exclusão étnica de origem histórica, que os coloca segundo os dados estatísticos sociais entre a maioria dos excluídos no Brasil.